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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Por que escrevo terror



Às vezes, me perguntam por que não escrevo histórias mais alegres, onde o herói fica com a mocinha e o vilão é punido no final. Ou por que não tento fazer literatura de verdade. Essa é outra pergunta que me persegue. Imagino que seja assim com todo escritor antes de ficar conhecido. Um aviso aos navegantes. Como se tivéssemos que preencher um molde a partir do momento em que o grande público tomasse conhecimento de nossas obras e não pudéssemos mais sair dele. O que, na minha cabeça, já daria um ótimo enredo para uma história de arrepiar os cabelos.

Por que escrevo histórias de terror? Bom, não é exatamente uma escolha consciente. É algo que me vem naturalmente. Gosto de escrever sobre coisas que me perturbam. Gosto de explorar meus medos, inseguranças e pesadelos. Ou os medos, inseguranças e pesadelos dos outros. Acredito que, ao fazer isso, esses fantasmas perdem o poder que tinham de me assustar. Escrevo para exorcizar meus demônios. E não tem jeito fácil de fazer isso. A jornada invariavelmente é aterrorizante. O único alento que carrego é a crença da necessidade de encarar as trevas para poder encontrar a luz e a paz que se encontram além dela. A noite sempre é mais escura antes do amanhecer.

Outra fonte de inspiração vem da própria realidade. Tenho plena convicção de que não existe nada mais assustador do que o mundo em que vivemos. Basta navegar cinco minutos na internet. Somos assaltados diariamente pela violência dos grandes centros urbanos, das ameaças de atentados terroristas, dos preconceitos elitistas e raciais, da turma do politicamente correto, das brigas por bandeiras políticas, pelo pessoal da vigilância do peso, pela ditadura da juventude, pela velocidade da informação. São tantas pequenas violências que as pessoas ficam anestesiadas, nada mais as abala, nada mais as comove, nada mais as impressiona.



Diante de tudo isso, é preciso ter uma válvula de escape que nos ofereça uma alternativa a esse turbilhão de loucuras. Mesmo que essa alternativa seja um universo repleto de monstros e seres repugnantes, que vão fazer o leitor querer dormir de luzes acesas e agradecer por não estar na pele de personagem X ou Y. Um dragão capaz de fazer um homem em pedaços com uma mordida nunca será mais assustador do que um ladrão louco de crack com uma arma apontada para a sua cara. A ameaça de morte é igual nos dois casos. Mas na ficção é muito mais fácil de encará-la sem se borrar todo. 

Acredito que a literatura de entretenimento funciona melhor quando reflete de forma distorcida a nossa  própria realidade. Por isso gosto de cenários quase sempre contemporâneos e personagens que estão longe de serem perfeitos e, muitas vezes, não são nem mesmo carismáticos. Gosto de deixar rótulos como herói ou vilão na prateleira, para serem usados de acordo com a situação. Minhas histórias se passam invariavelmente em áreas cinzentas, onde os mocinhos trocam de lugar com bandidos do mesmo modo que as prostitutas assumem o lugar de princesas. É importante mostrar ao leitor que os personagens podem acertar ou errar em igual medida e que ninguém é inteiramente inocente. É necessário que ele pense no quanto tudo aquilo parece real, de modo a se entregar mais facilmente para a narrativa.

Porque o que eu realmente gosto de fazer é quebrar com expectativas. É aí que, na minha opinião, reside a genialidade das boas ficções. É para isso que trabalho. Para escrever histórias que prendam a atenção, tenham uma dose adequada de reviravoltas e seja habitada por personagens marcantes, difíceis de esquecer. É claro que nem sempre terei sucesso. Mas eu tento. Em meio a um universo repleto de lobisomens, vampiros e demônios, tento ser um pouco original e arrancar aquele olhar de espanto com a virada de uma página. Se o leitor ficar com uma pulga atrás da orelha ao final da leitura, considero o meu trabalho feito.

É por isso que escrevo terror.

Bons pesadelos...